ZONA DE IMPACTO

 ISSN                                                                                                 ab irato

 

Vol. 4, Ano VIII, Novembro, 2005

 

            


 

 

FALA VERSUS ESCRITA: ATIVIDADES DE RETEXTUALIZAÇÃO

 

 

ROSA MARIA APARECIDA NECHI VERCEZE

DEPARTAMENTO DE LETRAS E LINGÜÍSTICA - UFRO

ERIK SANCHEZ NOGUEIRA

GRADUADO EM LETRAS - UFRO

 

Resumo: Na perspectiva de uma visão não-dicotômica, a idéia é mostrar as diferenças entre fala e escrita que se dão dentro de um continuum tipológico das práticas sociais de produção textual (Marcuschi, 2003). O contínuo fala/escrito permite distinguir e correlacionar modalidades textuais quanto às estratégias de formulação, originando características que produzem variações estruturais textuais-discursivas: seleções lexicais, estilo, grau de formalidade, planejamento, donde surgem semelhanças e diferenças ao longo de contínuos sobrepostos. Na verdade, fala/escrita abarcam um continuum do nível mais informal aos mais formais, passando por graus intermediários. Fala e escrita possuem manifestações de formulação diferentes. Ambas são produções textuais-discursivas, visando a fins comunicativos. A fala caracteriza-se pelo uso de sons sistemáticos, articulados e significativos, da utilização de aspectos prosódicos e de recursos expressivos: gestualidade, movimentos do corpo e mímica. A escrita apresenta-se através de sua constituição gráfica, manifesta-se por unidades alfabéticas, ideogramas e iconográficas. No geral não há escrita pura, enquanto modalidade autônoma, trata-se de modalidade de uso da língua complementar à fala. A análise fala e escrita proposta, permite observação e análise dos processos de retextualização por meio de operações textuais-discursivas na passagem do texto oral para o escrito.

 

Abstract: From the perspective of a non-dicotomical vision, the idea of this paper is to show the differences between speaking and writing activities within a typological continuum of social practices of textual production (Marcuschi, 2003). The continuum speaking/writing allows us to distinguish and co-relate textual modalities relating to the strategies of formulation, originating caracteristics which produce structural textual-discursive variations: lexical selections, style, degree of formality, planning from where it come similarities and differences together with the continuing assumptions. In fact, speaking/writing embrace a continuum from the most informal to the most formal level, passing through the intermediate degrees. Speech and writing have manifestation of different formulations. Both are textual and discursive productions, aiming at communicative ends. The speech characterize itself by the use of systematic sounds, articulated and meaningful, by the use of prosodic aspects and the expressive resources:gestures, movements of soul and body and mimicry The writing presents itself through the graphic constitution, manifests itself by alphabetic unities, Ideograms and iconography. In general there is no pure writing as an autonomous ode, it more a modality of use of language complementing the speech. The analysis of the spoken and written language proposed here, allows observation and analysis of processes through the textual-discursive operations in the passage from the oral to the written text.

 

1. Introdução

 

        Este artigo se propõe a levantar questões de cunho teóricas acerca da oralidade versus letramento, da fala versus escrita, utilizando-se de alguns referenciais teóricos, sobretudo, o estudo de Marcuschi (2003). Nesse primeiro momento, defende-se a posição de que não se pode tratar oralidade e letramento ou fala e escrita como formas textuais dicotômicas. A proposta é mostrar que essas modalidades são vistas num quadro mais abrangente no contexto das práticas comunicativas e dos gêneros textuais. Numa visão funcional a língua, tanto na produção oral como escrita, é vista como um contínuo de variações, graduações e interconexões. Tudo irá depender dos vários gêneros que se comparam. Haverá casos em os gêneros textuais podem apresentar uma maior proximidade entre fala e escrita quase que uma mescla, em outros, um distanciamento maior, mais marcado, porém não a ponto de haver dois sistemas lingüísticos ou duas línguas. Num segundo momento, propõem-se sugestões de análises através de processos de retextualização na passagem da fala para a escrita. O material utilizado para a análise constitui-se em fragmentos de textos - inquéritos de falas de adolescentes - sobre os quais serão propostos o trabalhado de retextualização da fala para a escrita por alunos de graduação em letras. Ao longo do artigo, todos os processos de transformação do texto falado para o escrito, serão apresentados. Convém enfatizar, a princípio, que não há limite ideal para essa transposição: tudo vai depender dos propósitos que temos em mente no momento da interação, numa dada situação interativa. Tenta-se adaptar o discurso mais para oral ou escrito, a depender do contexto discursivo, dos interactantes, das necessidades e da sociedade em que essas atividades se realizam.

 

2. Oralidade e Letramento

 

        É preciso observar atentamente que a oralidade e o letramento são duas práticas na civilização contemporânea. As investigações dessas duas variedades não são mais estanques, é impossível desvinculá-las, sem uma referência direta ao papel que desempenham nas práticas sociais, senão for considerada a distribuição de seus usos na vida cotidiana, uma vez que o tratamento de suas relações centra-se exclusivamente no código.

        Nesse sentido, oralidade e letramento constituem atividades interativas e complementares no contexto das práticas sociais e culturais. Assim, não são primeiramente as regras da língua que merecem atenção, mas sim, os usos da língua, já que é a variação lingüística que determina e permite uma escolha de gênero em todas as situações de uso da língua.

        O letramento como prática social ligada formalmente à escrita, possui uma história multifacetada e cheia de contradições. Numa sociedade como a nossa, a escrita, enquanto manifestação formal dos diversos tipos de letramento, é mais do que uma tecnologia. Para ser letrado, não é necessariamente preciso saber ler e escrever. O status da escrita não pode ser restrito a isso. O letramento envolve as mais diversas práticas da escrita (nas mais variadas formas) na sociedade e pode ir desde uma apropriação mínima da escrita, tal como o indivíduo que é analfabeto, mas letrado na medida em que identifica o valor do dinheiro, identifica o ônibus que deve tomar, consegue fazer cálculos complexos, sabe distinguir as mercadorias pelas marcas, reproduz discursos por meio de sua fala, com reflexões críticas e pontos de vistas, etc., mas não escreve cartas nem lê jornal regularmente, até uma apropriação profunda, como o caso do indivíduo que desenvolve tratados de Filosofia e Matemática ou escreve romances. Letrado é o indivíduo que participa de forma significativa de eventos de letramentos e não apenas aquele que faz um uso formal da escrita (Marcuschi, 2003).

        A oralidade, por sua vez, seria uma prática social interativa para fins comunicativos que se apresenta sob variadas formas ou gêneros textuais fundados na realidade sonora; ela vai desde a realização mais informal a mais formal nos mais variados contextos de uso.

Dessa forma, oralidade e letramento constituem um contínuo, pois permitem a construção de textos coesos e coerentes, a elaboração de raciocínios abstratos, exposições formais e informais, variações de estilo, sociais e dialetais. As limitações e alcance entre ambas estão dados pelo potencial básico de sua realização: uma gráfica e a outra, som. Marcuschi (2003) enfatiza que

 

(...) a eficácia comunicativa e potencial cognitivo não são vetores relevantes para distinguir oralidade e escrita, de modo que a tese da grande virada [1]cognitiva que a escrita, de modo especial à escrita alfabética, representaria com seu surgimento na humanidade, não passa de um mito já superado.

 

        A escrita vindo tardiamente em relação ao surgimento da oralidade, permeia hoje quase todas as práticas sociais, até mesmo os analfabetos, em sociedades com escrita, sob a influência do que no mundo contemporâneo convencionou-se a chamar de práticas de letramento. A escrita é usada em contextos sociais básicos da vida cotidiana, em paralelo diretos com a oralidade como; trabalho, escola, dia a dia, família, vida burocrática, atividade intelectual.

        É importante considerar as diferenças entre o letramento e a alfabetização. Enquanto o primeiro trata-se de um processo de aprendizagem social, histórico da leitura e da escrita, em contextos informais e para usos utilitários, por isso é um conjunto de práticas sócias. O segundo pode ocorre numa instituição escolar, mais precisamente, é sempre um aprendizado mediante ensino e compreende o domínio ativo e sistemático das habilidades de ler e escrever. Nesse sentido, a alfabetização é uma habilidade restrita, uma vez que a escolarização é uma prática formal e institucional de ensino que visa a uma formação integral do indivíduo, sendo apenas uma das atribuições da escola. (Marcuschi, 2003).

 

3. Fala versus escrita

 

        A atenção aqui se volta para os usos da língua, pois o que determina a variação lingüística em todas as manifestações são os usos que fazemos da língua. São as formas lingüísticas que se adequam aos usos e não o inverso. Não importa que a faculdade da linguagem seja um fenômeno inato e universal igual a todos, o que é preciso é voltar à atenção para a capacidade do falante de uso da língua. Marcuschi (2003) estabelece uma distinção entre fala e escrita como as práticas sociais e modalidades de uso da língua e as define:

 

A fala seria uma forma de produção textual-discursiva para fins comunicativos na modalidade oral (...), sem a necessidade de uma tecnologia além do aparato disponível pelo próprio ser humano. Caracteriza-se pelo uso da língua na sua forma de sons sistematicamente articulados e significativos, bem como a (...) prosódia, envolvendo, ainda, uma série de recursos expressivos de outra ordem, tal como a gestualidade, os movimentos do corpo e a mímica.

A escrita seria um modo de produção textual-discursiva para fins comunicativos com certas especialidades materiais e se caracteriza por sua constituição gráfica, embora envolva recursos de ordem pictórica e outros, pode-se manifestar pela escrita alfabética (ideogramas, unidades iconográficas). No geral nunca há “escritas puras”, trata-se de uma modalidade de uso da língua complementar à fala.

 

        Então, a questão equivocada de que a escrita é derivada e a fala é primária deve ser desmistificada, uma vez que a escrita não consegue reproduzir muitos dos fenômenos da fala: prosódia, gestualidade, movimentos do corpo, olhos, mímicas etc.. Em contrapartida, a escrita apresenta elementos significativos próprios para sua representação: parágrafos, tipos de letras, pontuação, grafia alfabética. Enfim, ambas possuem um mesmo sistema lingüístico que permitem a construção de textos coesos e coerentes em diversas variedades lingüísticas. A manifestação do falante dentro de uma ou outra variedade está na sua forma de realização dentro de cada contexto situacional em que esteja inserido.

        Contudo, mais relevante é esclarecer a natureza das práticas sociais que envolvem o uso da língua - fala ou escrita. Estas práticas permitem colocá-las num eixo de um contínuo sócio-histórico de praticas - forma de uma gradação ou de mesclagem. Tudo dependerá do ponto de vista observado e das realidades comparadas.

Um exemplo típico que ilustra esse contínuo entre escrita e fala, são os “bate-papos” na Internet. Temos nessa situação, um modo de comunicação com características típicas da fala e da escrita, constituindo-se esse gênero comunicativo como um texto misto, num entrecruzamento entre fala e escrita. Assim, algumas características atribuídas à fala como as simultaneidades temporais (pensar e falar ao mesmo tempo) são possíveis na prática da escrita à distância, graças à tecnologia. Este ”escrever” ou "teclar" no contexto da produção discursiva dos “bate-papos” on-line é uma forma de nos relacionarmos com a escrita, mas não propriamente uma nova forma de escrita. Para Marcuschi (2003) “a fala, enquanto manifestação da prática social é adquirida naturalmente em contextos informais do dia a dia e nas relações sociais e dialógicas que se instauram desde o momento em que a mãe dá seu primeiro sorriso ao bebê”.

        Para Marcuschi (2003) “a fala é uma forma de inserção cultural e de socialização. Por outro lado, a escrita, é adquirida em contextos formais como na escola. Nesse patamar surge a escrita como o mais prestigioso bem cultural desejável.”

        Na sociedade atual, tanto a fala quanto a escrita são imprescindíveis. Trata-se, pois, de não confundir seus papéis e seus contextos de uso, e de não discriminar seus usuários.

        Na verdade, a prática de produção textual-discursiva que o falante faz uso para a comunicação básica, está subjacente à prática social interativa, pois, uma vez que se insere socialmente como parte de uma comunidade, toma a fala como sua prática lingüística para engajar-se nas várias situações de interação social. Fala e escrita consolidam-se enquanto práticas sócias que servem aos propósitos da comunicação e da interação social, a diferença entre ambas estão na sua manifestação de uso.

        Embora a escrita seja uma modalidade autônoma, complementar à fala, pode-se intuir que uma análise entre fala e escrita propicia oportunidade de apresentar, de forma mais sistematicamente, diferenças entre ambas: na fala há as marcas lingüísticas de planejamento passo a passo, enquanto discurso produzido numa interação face a face e na escrita, a ausência de marcas de planejamento, a apresentação de texto acabado, coeso, com frases mais densas e complexas.

 

4. Perspectiva sócio-interacionista

 

        Tanto a fala quanto a escrita são atividades textuais-discursivas, pois por meio delas construímos sentidos para o discurso num processo de interação. Na fala a interação é face a face e, na escrita a interação é no interagir com o texto num trabalho cooperativo entre autor/leitor. A preocupação com os processos de produção de sentido deve ser vista como processos interativos situados em contextos sociais e historicamente marcados por atividades de negociação ou por processos inferenciais. Os processos interativos não tomam as categorias lingüísticas como dados, a priori, mas como construções interacionais sensíveis aos fatos culturais. Para uma análise dos usos textuais em sociedade atenta-se para fenômenos cognitivos e processos de textualização na fala e escrita, que permitem a produção da coerência como uma atividade do leitor/ouvinte sobre o texto recebido. Gumperz (2002) ao tratar dos processos de inferência diz:

 

O processo inferencial é de natureza sugestiva, nunca assertiva, baseado em pressuposições: são construções hipotéticas sobre os propósitos comunicativos (pois se trata da interpretação do ouvinte sobre o que o falante deseja comunicar, e essa interpretação só poderá ser validada quando conjugada ao conhecimento pressuposto, nunca em termos de valores absolutos). Resta mencionar que esse conhecimento pressuposto ou "conhecimento de mundo" é reinterpretado na conversa, sendo construído social e interacionalmente.

 

        A cultura é um dado que torna o ser humano especial no contexto dos seres vivos, porém, o que o torna mais especial é o fato de dispor de uma linguagem simbólica articulada, servindo, portanto, como uma prática que lhe permite estabelecer crenças e pontos de vistas diversos ou coincidentes sobre as mesmas análises de mundo. Neste caso, a língua é um ponto de apoio e de emergência no consenso e no dissenso, na harmonia e na luta. Não importa, se a modalidade seja fala ou escrita, o que se destaca é a evidente dos diversos modos de representação cognitiva e social que se realizam nas práticas específicas. De acordo com Olson (1997:32), citando Canuthers, este afirma que “o fato de escrevermos alguma coisa não pode alterar nossa representação mental dessa coisa.” Assim, acrescenta Marcuschi (2003):

 

A fala e escrita não são dois modos qualitativamente diversos de conhecer ou dar a conhecer. A escrita não acrescenta massa cinzenta ao indivíduo que a domina bem como o não-domínio da escrita não é evidência de menor competência cognitiva. Deve, pois, distinguir entre conhecimento e capacidade cognitiva. Quem domina a escrita pode, eventualmente, ter acesso a um maior número de conhecimentos. Não é verdade, no entanto, que a fala é o lugar do pensamento concreto e a escrita o lugar do pensamento abstrato. Em resumo: a retextualização não é, no plano da cognição, uma atividade de transformar um suposto pensamento concreto em suposto pensamento abstrato. A supremacia cognitiva da escrita sobre a fala já foi superada.

 

        Com base na última citação, o autor adverte que a competência cognitiva não advém do domínio da escrita. Uma pessoa não letrada e que lhe falta a habilidade da escrita, utiliza com naturalidade sua competência cognitiva e comunicativa nas interações sociais. Assim a fala e a oralidade são práticas sociais inerentes aos ser humano, não há tecnologia que possa substituir essa prática social. A oralidade sempre será a porta voz da iniciação à racionalidade do ser humano. É fator de identidade social porque a língua é socialmente moldada e se constitui em pleno desenvolvimento. Stubbs (1980) reconhece a primazia da escrita, mas a fala será sempre atividade comunicativa. Veja o que diz:

 

A fala tem grande precedência sobre a escrita, porém do ponto de vista do prestígio social, a escrita se destaca. Não por se tratar de critérios intrínsecos nem por parâmetros lingüísticos, mas por postura ideológica. Mesmo considerando a inegável primazia da escrita nos povos “letrados”, a oralidade, jamais, desaparecerá e sempre será, ao lado da escrita, o grande meio de expressão social e de atividade comunicativa.

 

        Quando a escrita se serve à literatura, aos traços da realidade lingüística regional ou características estilísticas peculiares de certas autorias, pauta-se pelo padrão, não é estigmatizada e não entra como fator de identidade individual ou grupal. Todavia, isso não se presta a qual gênero textual; nos textos de jornais, por exemplo, nem sempre se tem a autoria como traço identificador de quem o produziu. Com efeito, a fala pode facilmente levar a estigmatização do indivíduo, porque como uma variedade lingüística, em geral, pauta-se por desvios da norma e tem caráter identificador. É possível identificar um sujeito falante pela sua variedade lingüística e sua fala constituir um desvio da norma-padrão. Convém lembrar que não existe variedade lingüística melhor ou pior, estigmatizar um sujeito pela sua fala é preconceito lingüístico. A norma-padrão é apenas uma de muitas variedades lingüísticas, o que a destaca é o seu prestígio social, porém, todo falante tem competência comunicativa, independente de fazer usou não da norma-padrão.

        Se, por exemplo, se colocar um grupo de indivíduos letrados a escrever textos sobre o mesmo tema “a inflação na vida brasileira”, na observação de seus textos, é provável que suas opiniões constituam objetos de discussão, no entanto, eles não serão estigmatizados pela linguagem como tal, a menos que violem algumas normas específicas. Ao passo que, se pedirem para esse mesmo grupo exponha oralmente sobre o tema, ter-se-á diferenças de avaliações que não devem ao conteúdo elaborado na escrita, mas, sim, a uma particular forma de “falar” o conteúdo.

        Se levar em conta, os usos quotidianos da língua, certamente constatará que a fala e a escrita não são responsáveis por domínios dicotômicos. Por exemplo, há práticas mediadas de preferência pela escrita e outras pela fala. Um caso típico acontece na área jurídica, em que há a presença rígida da escrita, pois a Lei deve ser tomada ao “pé da letra”. No entanto, essa área faz uso intenso e extenso das práticas orais no tribunal, o que comprova que numa mesma área discursiva, convivem práticas diversas, ambas fortemente marcadas. Assim, a fala e a escrita são duas práticas sociais e não duas propriedades de sociedades diversas.

        O cerne da confusão na identificação e avaliação de semelhanças e diferenças entre fala e escrita, acha-se pautado no enfoque enviesado e preconceituoso a que a questão foi submetida, resultando metodologias inadequadas e visões contraditórias. Quando, a atenção se concentra na escrita, há a impressão de se estar apontando para um fenômeno se não homogêneo, bastante estável, claro, definido e com poucas variações. O contrário ocorre na fala que se apresenta como modalidade espontânea, variada e curiosamente não vem a nossa mente, em primeira mão, que a fala seja padrão (Marcuschi, 2003).

        Para deixar claro que não se pode entender fala e escrita como duas modalidades estanques e que nas situações da vida cotidiana elas se alternam todo tempo enquanto discursos necessários para as atividades de práticas sociais, logo se pode citar Marcuschi (2003) que diz:

        As diferenças entre fala e escrita se dão dentro de um continuum tipológico das práticas sociais de produção textual e não na relação dicotômica de dois pólos opostos. E ainda, o autor acrescenta que o contínuo dos gêneros textuais distingue e correlacionam os textos de cada modalidade (fala e escrita) quanto às estratégias de formulação que determinam o contínuo das características que produzem as variações das estruturas textuais-discursivas, seleções lexicais, estilo, grau de formalidade, etc., que se dão num contínuo de variações, surgindo daí semelhanças e diferenças ao longo de contínuos sobrepostos.

        A relação estabelecida entre a fala e a escrita num contínuo de gêneros que vai da modalidade menos informal à modalidade mais formal é apresentada no gráfico abaixo, elaborado por Marcuschi (2003). O autor explicita a hipótese aqui postulada que contempla a relação fala e escrita numa visão não dicotômica sob o ponto de vista sócio-interacional.

 

 

        Como se pode ver, fala e escrita apresentam-se num continuum que abrange vários gêneros textuais. Há os que se aproximam mais da fala e outros mais amplos no contexto que estão mais próximos da escrita. Não há padrão fechado. Os gêneros oscilam em manifestações orais ou escritas, e seu maior ou menor planejamento da linguagem dependerá das intenções do falante. É lógico que há situações nas práticas sociais que exigem a presença de um determinado gênero textual específico.

        A visão funcional sugere que se preserve um continuo de variações, gradações e interconexões entre fala e escrita. Há casos que as proximidades entre fala e escrita são tão estreitas que parece haver uma mescla, ou quase uma fusão entre ambas tanto nas estratégias textuais como nos contextos de realização. Há outros, em que há a distância é marcada, mas não a ponto de se ter dois sistemas lingüísticos. Nesse parâmetro, as relações entre fala e escrita recebem um tratamento mais adequado, permitindo aos usuários da língua maior conforto e segurança em suas atividades discursivas.

 

5. Processos de retextualização

 

        Para o tratamento de retextualização na passagem da fala para a escrita, não há um limite ideal para a transformação: tudo vai depender do que temos em mente numa dada situação. O formato de nossas atividades varia muito, a depender dos contextos, dos interactantes, das necessidades e da sociedade em que as atividades se realizem.

        A retextualização trata-se de um processo que envolve operações complexas que interferem tanto no código como no sentido e evidenciam uma série de aspectos nem sempre bem-compreendidos da relação fala-escrita. A passagem da fala para a escrita recebe interferências mais ou menos acentuadas a depender do que se tem em vista. Essa passagem, como enfatiza Marcuschi (2003), “não é a passagem do caos para a ordem: é a passagem de uma ordem para outra ordem”.

        Por isso, para sua realização é de extrema importância levar em conta, antes de tudo, a compreensão da fala a que se quer retextualizar. Essa atividade de compreensão, nunca deve ser ignorada, pode ser fonte de problemas no plano da coerência durante o processo de retextualização, por ser fruto de uma atividade cognitiva, pois ao ser retextualizado um texto, podem ocorrer interferências tanto na forma e substância da expressão como na forma e substância do conteúdo, sendo que neste segundo conjunto a questão se torna mais delicada e complexa, pois mesmo de forma implícita, muitas vezes o falante que retextualizar pode deixar marcas subjetivas ou falsear o conteúdo do texto base.

        Para o trabalho com a retextualização é preciso distinguir os dois processos que dão conta da reorganização textual: as atividades de idealização e as atividades de transformação.

 

5.1 As atividades de idealização

 

        Dizem respeito às operações que envolvem a regularização dos fenômenos de (des)continuidade sintática na formulação textual: hesitações, correções, marcadores conversacionais, repetições e truncamentos que aparecem na construção da fala. Além das (des)continuidades sintáticas, há de se considerar as (des)continuidades discursivas: A descontinuidade sintática seria aquela que trata das regras de editoração [2] (Taylor & Cameron, 1987), e a descontinuidade discursiva seria aquela em que se dariam: digressões, rupturas tópicas, inserções incompreensíveis, desconcatenação sócio-interacional e deslocamento situacional, entre outros.

        Se forem considerados esses dois fenômenos no plano discursivo e não gramatical, haveria a noção de fluência discursiva de um lado e a noção de fluência sintática de outro. A fluência discursiva envolve aspectos da interação e textualidade, além dos sintáticos. Como essas distinções são relativas e complexas, pode-se postular uma dicotomia e isso, é o que se tenta evitar, pois não é propósito desse estudo separar de forma estanque em dois blocos independentes, as duas modalidades, fala e escrita, portanto, não se segue aqui a posição teórica de Taylor & Cameron (1987) de maneira estrita.

 

5.2 As atividades de transformação

 

        Constituem a retextualização em sentido estrito, são operações que vão além da simples regularização lingüística, pois envolvem procedimentos de substituição, reordenação, ampliação/redução e mudanças de estilo, desde de que não atinjam as informações como tal. Certamente, haverá mudanças de conteúdo, mas essas não devem atingir o valor de verdade dos enunciados.

        As atividades de retextualização constituem rotinas usuais altamente automatizadas, não mecânicas. Aparentemente, não ocasionam problemas pois, se utilizam no dia a dia, o tempo todo, as sucessivas reformulações dos mesmos textos numa intrincada variação de registros, gêneros textuais, níveis lingüísticos e estilos. Em síntese, toda vez que se repete ou relata o que alguém diz, até mesmo quando se cita as supostas citações ipsis verbis, realiza-se as atividades de reformulação e transformação, recriando e modificando uma fala em outra. Essas atividades, segundo Gumperz (2002), são sustentadas pelas pistas de contextualização que são, na verdade, uma constelação de traços presentes na estrutura de superfície da fala sobre as quais os falantes sinalizam e os ouvintes interpretam a atividade que está ocorrendo, bem como o contudo semântico que deve ser entendido e, ainda, como cada oração se relaciona ao que a precede ou sucede.É a partir dessa interpretação do ouvinte que se desencadeiam as atividades de reformulação e transformação. Veja o que diz Gumperz sobre as pistas de contextualização:

 

Tais pistas podem aparecer sob várias manifestações lingüísticas, dependendo do repertório lingüístico, historicamente determinado, de cada participante. Os processos relacionados às mudanças de código, dialeto e estilo, alguns dos fenômenos prosódicos (...) como as possibilidades de escolha entre opções lexicais e sintáticas, expressões pré-formuladas, aberturas e fechamentos conversacionais, e estratégias de seqüenciamento podem, todos, ter funções semelhantes de contextualização. Embora tais pistas sejam portadoras de informação, os significados são expressos como parte do processo interativo (...) os significados das pistas de contextualização são implícitas (Gumperz, 2002).

 

        Essas atividades de retextualizações podem ocorrer de maneiras bastante diversificadas em nossas sociedades e ocasionar modificações nos jogos lingüísticos. Por exemplo, um documento que caracterize uma proposta governamental de Lei, certamente terá várias versões e passará por várias “mãos” para avaliação e reformulação. (plenário - na câmara dos deputados, jornais, Tv, radio, votação). Uma ação de reescrita que caracteriza um fato comum no dia-a-dia.

        É, ainda, de extrema importância distinguirem-se as atividades de retextualização das de transcrição. A primeira diz respeito às interferências na ordem do texto retextualizado: mudanças de estruturas sintáticas, semânticas, etc. A segunda restringe-se na passagem de um texto de sua realização sonora para a forma gráfica com base numa série de procedimentos convencionalizados. Nesse primeiro percurso, certamente há uma série de operações e decisões que conduzem as mudanças relevantes e não podem ser ignoradas. No entanto, essas mudanças devem ser de ordem a não interferir na natureza do discurso produzido do ponto de vista da linguagem e do conteúdo.

        A transcrição constitui basicamente a passagem das palavras pronunciadas para uma formatação escrita num sistema gráfico, que, em via de regra, segue a grafia padrão. Transcrever não é uma atividade de metalinguagem nem de simples interpretação gráfica do significado sonoro. A transcrição já representa uma passagem, uma transcodificação que já caracteriza uma primeira transformação, mas não é ainda uma retextualização. O importante nessa transformação é considerar a substância e a forma de conteúdo, pois é por meio da tomada de consciência do conteúdo da informação oral que se pode chegar a sua compreensão, senão não é possível a transcodificação.

        Para a transcrição propriamente, usa-se um sistema de sinais próprios para as notações que darão origem a transcodificação (maiúscula para tom mais alto, silabação para fala pausada, três pontos para a pausa, barra para truncamento de palavras, alongamento de vogais, repetições, comentários para indicação de aspectos ou falas circunstanciais, extratópica, etc). Adota-se no plano da expressão, estes sinais de convenções para que se possa manter o máximo de fidelidade à produção oral, porém, neste procedimento que pode ser chamado de adaptação, já ocorrem perdas, pois sempre haverá algo que escapa ou que muda. Por exemplo, a entoação, os aspectos gestuais e mímicos e a situação em que ocorre a fala. Esses aspectos não há como serem regatados na escrita.

É importante estar atento para as diferenças entre a transcodificação e a adaptação. Para se passar um discurso oral para o escrito, há o primeiro processo de transcodificação visto. Durante esta execução, ocorrem às adaptações, e disso, resulta um segundo processo – a transformação - que sistematicamente conduz a retextualização. Veja por exemplo, um jornalista ao realizar a transcrição da gravação de uma entrevista, geralmente “revê” ou corrige passagens dessa entrevista, ou seja, acaba por interferir tanto na forma e substância da expressão como na forma e substância do conteúdo, sendo que o segundo se torna mais complexo.

        Como se observa, a tarefa da transcrição não é algo simples, nem natural. É uma atividade que atinge de modo bastante acentuado a fala original, e pode ir de um patamar elementar até uma interferência muito grande. Toda transcrição já constitui uma primeira interpretação na perspectiva da escrita. Há questões éticas envolvidas, na medida em que uma transcrição pode reproduzir preconceitos, pelas evidências socioletais em marcas gráficas. Isso constitui um perigo que deve ser observado, pois muitas vezes há na fala do entrevistador um status diferente de seu informante, o que caracteriza a fala culta e não padrão. Quanto se trata de conversas informais, os preconceitos das variedades lingüísticas tendem a desaparecer, porém o preconceito pode estar presente no tema conversado, mas isso é outro aspecto.

        É relevante destacar aqui algumas variáveis intervenientes, que não se esgotam no código, que mudam a perspectiva de observação do transcritor que pode ir de transformações mais superficiais, e amenas até transformações mais drásticas, a saber:

        O propósito ou objetivo da retextualização: depende da finalidade de uma transformação, que certamente ocasiona uma diferença acentuada no nível de linguagem. Quando se trata de uma fala comum e casual, a transformação será mais descontraída, lingüisticamente informal, porém se a fala é mais formal, atende mais à variedade culta, receberá um tratamento de transformação mais formal, acatando mais aos propósitos cultos, tendo a linguagem mais talhada.

        A relação entre o produtor do texto original e o transformador: um texto oral pode ser refeito pelo próprio autor. Neste caso, o autor, ao retextualizar seu texto, fará uso de mudanças mais drástica, desprezando a transcrição propriamente, redigindo um outro texto, porém, mesmo assim não conseguirá eliminar todas as marcas da oralidade. Por outro lado, caso o texto seja retextualizado por outro autor, será mais “respeitado” diante do texto original, ocasionando menor números de mudanças no conteúdo, embora possa fazer muitas interferências na forma textual. Neste caso, as marcas de oralidade tendem a ficar mais evidente.

        A relação tipológica: aspecto interessante, refere-se mais especificamente aos gêneros textuais: uma narrativa oral pode ser passada para a escrita. Neste percurso haverá modificações menos drásticas. Por exemplo: uma entrevista científica concedida a um jornalista quando passada para o jornal na forma de artigo de divulgação científica, a tendência é que se mantenha a fidelidade do conteúdo científico e a imparcialidade.

        Os processos de formulação: a questão da estratégia de produção textual vinculada a cada modalidade deve ser levada em conta. Conforme lembra Rey-Debove (1996) apud Marcuschi (2003) tem-se a escrita “neutralizada”, desaparecendo os vestígios da correção e tem-se a “neutralização pela metalinguagem” que traz a correção como parte integrante do próprio texto oral. Deste modo, os efeitos de “maior perfeição” - corretude da escrita - e de “imperfeições” - incompletude da fala caracterizam-se como processos estratégicos da formulação na retextualização e recebem soluções que não se correspondem quando se observa o produto final.

        Assim, se intui pelas quatro variáveis que as operações de retextualização da fala para a escrita são atividades conscientes que seguem variados tipos de estratégias: formas lingüísticas que são eliminadas e outras introduzidas; outras substituídas e outras reordenadas. Essas estratégias caracterizam um primeiro momento – as estratégias de regularização.

        Posteriormente, podem surgir outras estratégias que afetam as estruturas discursivas: o léxico, o estilo, a ordenação tópica, a argumentatividade e acham-se ligadas à reordenação cognitiva e a transformação que atinge a forma e substancia do conteúdo pela via da mudança na qualidade da expressão - caracteriza as estratégias de transformação.

Para Catach (1996) apud Marcuschi (2003) quando se fala na relação entre oral/escrito, a tendência é levar em conta a distinção no plano da relação que pode ocorrer: (1) nas formas (códigos e sistema lingüístico) e (2) nos processos (realizações, discursos). Para as atividades de retextualização, há de se considerar os dois planos, porém, em essência o aspecto discursivo tende a se destacar.

        Não há como precisar quais os limites entre os aspectos lingüísticos textuais-discursivos e os cognitivos, todavia, a indicação é que se trata mais de uma gradação do que uma separação.

        Para um estudo mais didático, pode-se estabelecer uma divisão para os aspectos envolvidos nos processos de retextualização.

 

Aspectos lingüísticos textuais-discursivos

1. Idealização: eliminação, completude e regularização

2. Reformulação: acréscimo, substituição e reordenação

3. Adaptação: tratamento da seqüência dos turnos

4. Cognitivos: inferência, inversão e generalização.

 

        Para esse artigo, os aspectos a serem considerado serão as atividades de idealização e reformulação, mesmo porque, os aspectos cognitivos e adaptação, apresentam-se, de certa forma, diluídos nos outros dois aspectos. Isso porque quando se re-textualiza um texto do oral para o escrito, a operação de cognição contribui, operando na compreensão da fala. Durante o processo de compreensão faz-se inferências, levanta-se suposições, cria-se generalizações para que se possa ter um entendimento mútuo do texto, só depois disso, torna-se possível a retextualização, o mesmo ocorre com o aspecto de adaptação, quando se trata da seqüência de turnos no texto dialogado, ao ser retextualizado, os turnos, característicos da fala, diluem-se, transformando-se enunciados seqüenciados por parágrafos, o que já assinala a presença dos primeiros passos para a transformação em texto escrito.

        As regras ou operações para a retextualização devem ser levadas em conta. Geralmente não há uma hierarquia ou seqüência, mas as operações em certo sentido se dão preferencialmente nessa ordem, embora mescladamente.

        Conforme vem se mostrando, para as regras de retextualização, no quadro abaixo,

 

considera-se somente (1) as regras de regularização - (operações de 1-4) fundam-se nas estratégias de eliminação e inserção. Ainda não se introduz, nesses casos, uma transformação propriamente. Em (2) as regras de transformação – (operações de 5-9) fundam-se as estratégias de substituição, seleção, acréscimo, reordenação e condensação, são propriamente as que caracterizam o processo de retextualização. (Marcuschi, 2003).

 

        Operações textuais-discursivas na passagem do texto falado para o escrito

 

 

        Com efeito, o modelo proposto por Marcuschi (2003) acima segue uma escala contínua de estratégias, desde de fenômenos mais próximos típicos da fala até os mais específicos e restritos da escrita. O domínio nesse contínuo vai se manifestando, progressivamente, conforme o retextualizador vai avançando e dando conta das operações. Não há parâmetros fixos para as operações, pode-se pular etapas, parar em outras, dar por encerrado a retextualização em determinada operação, ou seja, em qualquer ponto do processo. Isso irá depender da maturidade lingüística do retextualizador quanto à consciência das diferenças da relação fala-escrita.

        Vejam as características de cada operação:

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1ª Operação: Eliminação das marcas interacionais, hesitações e partes de palavras.

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        Desaparecem as hesitações: ah..., eh, ...e..., o.., dos..., etc. Os marcadores conversacionais lexicalizados: né, sabe, bom, bem, assim, tipo assim, certo, viu, entendeu, que acha, hã, hum, etc. Os truncamentos de palavras: Sabe a Camilla el/ ela viu o Pedro, daí ela fal/ falo assim. E por fim, as sobreposições de vozes, que caracterizam dois falantes falando ao mesmo tempo.

F1 Foi a Camilla que te contou isso

F2 foi, eu tava na escola falano com o Pedro ai ela chegou daquele jeito você sabe

                                                                         [ 

                                                                        F1 Camilla não tem jeito é perdida

Além das marcas interacionais, são eliminadas as observações metalingüísticas sobre a situacionalidade ou sobre o fluxo da fala: ((risos)), (( ruídos)), (( tosse)), ((vozes externas)), etc

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2ª Operação: Introdução da pontuação com base na intuição fornecida pela prosódia e entoação na fala.

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        A prosódia vem marcada geralmente por três pontos (...). Essa operação surge como um primeiro mecanismo de inserção da representação sonora que é marcada na escrita pela pontuação. Na escrita as unidades devem ser visivelmente marcadas por pontos, vírgulas, dois pontos e etc, numa dependência intuitiva da prosódia da fala, pois auxilia na construção e interpretação do texto escrito a depender das intenções do indivíduo que o re-textualiza. Nessa operação poderá ou não aparecer a necessidade do parágrafo, isso irá depender das necessidades e intuições do retextualizador.

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3ª Operação: Eliminação de repetições, reduplicações, redundâncias, paráfrases e pronomes egóticos.

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        Estas eliminações são na verdade a retirada de certos itens lexicais, sintagmas, orações ou estruturas que estão a mais no texto, elementos sentidos como desnecessariamente reduplicados. A retirada desses aspectos/ elementos em conjunto, gera a necessidade de reformulações parafrásicas. O texto certamente sofre alterações na estrutura sintática. Os pronomes egóticos (eu, nós) em função de sujeito são eliminados, pois o morfema verbal marca a pessoa do verbo, e eles se tornam redundantes. Quanto aos pronomes objetos (falei com ela, ele, você) podem ainda permanecer, isso dependerá da maturidade lingüística do indivíduo que o retextualiza.

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4ª Operação: Introdução da paragrafação e pontuação detalhada sem modificação da ordem dos tópicos discursivos.

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        Introdução da paragrafação e pontuação detalhada sem modificação da ordem dos tópicos discursivos. A questão do parágrafo não se acha necessariamente ligado à pontuação, pois diz respeito a uma decisão de agrupamento do conteúdo por critérios. Geralmente, a paragrafação surge da necessidade de se agrupar um novo conjunto temático. Os fenômenos trabalhados nessa operação baseiam-se em formas de regularização prosódica e informacionais que precisam de estabilidade. A impressão é de uma necessidade de "disciplinar" o texto, dando-lhe a aparência mínima da escrita que tem normas mais específicas, constitui uma espécie de depuração textual.

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5ª Operação:Introdução de marcas metalingüísticas para a referenciação de ações e verbalização de contextos expressos por dêitico.

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6ª Operação: Reconstrução de estruturas truncadas, concordâncias, reordenação sintática, encadeamentos de orações.

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        Essas duas operações geralmente são processadas ao mesmo tempo. Aqui já se iniciam os processos de transformação propriamente. Faz-se necessário aplicar as atividades de substituição e reorganização de natureza pragmática e morfossintática. A atenção volta-se para a regularização sintática e explicitação dos referentes. Por isso, as noções de completude, regência e concordância devem-se voltar para as regras da escrita. Deve-se estar atento para a concordância entre sujeito e verbo, substituição de sujeitos como "a gente vamos", por equivalentes. Preenchimentos de frases inacabadas, típicas da fala. Eliminação de pronomes sujeitos repetidos e uso da anáfora pronominal sempre com antecedente explícito. Um dêitico como (esse, esta, aqui, lá, etc) devem estar ligados a um referente no texto. Seu referente deve ser reconhecido no texto. Também, a evidência de preferência de estruturas coordenadas e subordinadas típicas da escrita. “A fala vai seqüenciando adendos à direta do núcleo verbal, no fluxo do pensamento que é formado on line – em tempo real; a escrita prefere agrupar os elementos à esquerda do núcleo verbal.” (Marcuschi, 2003).

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7ª Operação: Tratamento estilístico com seleção de novas estruturas sintáticas e novas opções léxicas.

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8ª Operação: Reordenação tópica do texto e reorganização da seqüência argumentativa.

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        Essas duas operações envolvem acréscimo informacional, substituição lexical, reordenação estilística e redistribuição dos tópicos discursivos em parágrafos quando for o caso. Não é fácil determinar os critérios para a execução das operações situadas nesse nível. Acrescentar informações, substituir léxicos, redistribuir tópicos ou ordenar assuntos dependerá muito do estilo de fala/escrita do falante e também de um maior domínio da escrita e das estratégias de organização lógica do raciocínio. Tudo isso, leva a uma forte influência do processo cognitivo. Por exemplo, para a execução de uma transformação entre os marcadores da fala com os usados na escrita, não consiste em simples substituição, mas em saber quais são os conectivos e operadores da escrita e seu emprego adequado.

        Assim, o fenômeno da interpretação/compreensão textual é necessário para a transformação. Para transformar é necessário compreender o texto. Com efeito, uma compreensão falseada ou a não compreensão não impedem a retextualização, porém, pode conduzir a uma transformação problemática, com desvios. Deste modo, se for considerado o texto como uma proposta de sentido e não uma evidência empírica de sentidos objetivamente inscritos, ter-se-á dificuldades de interpretação. As construções sintáticas têm valor semântico e podem mudar o valor de verdade de um enunciado, uma vez que a força ilocucionária do sujeito discursivo pode influenciar nas escolhas semânticas. Se as escolhas sintáticas equivalem a escolhas semânticas, certamente haverá interferências na ordem sintática e em conseqüência haverá uma interpretação subjacente do sujeito discursivo que pode "carregar lingüisticamente" a produção re-textualizada de outras intenções, interferindo na construção e interpretação das escolhas no texto. “Essa condição de identidade de sentidos entre texto-base e o texto-alvo seria impossível, pois qualquer interferência na forma é também uma interferência no conteúdo” (Marcuschi, 2003).

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9ª Operação: Agrupamento de argumentos condensando as idéias.

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        Apresenta uma tendência à redução textual e operações de reordenação de natureza global (macroestrutura textual). Por exemplo, pode-se trazer para o início de texto, um argumento colocado no meio ou no final do texto e vice-versa. Quando se fala em agrupamento de argumentos, não deve ser entendido como uma estratégia de resumo com eliminação sistemática de informações secundárias. O propósito básico é preservar, na medida do possível, o máximo de informações, o mesmo volume de informações. Portanto, deve-se estar atento que o menor volume de linguagem se dá por elementos típicos da fala que trazem ao texto retextualizado redundâncias, repetições, ambigüidades e isso pode ser eliminado, mas, as seleções das informações integrais do conteúdo do texto devem ser preservadas. “Transformar fala em escrita pode acarretar diminuição de texto, mas não necessariamente por razões de seleção das informações mais importantes e sim pela regularização lingüística que implica redução no volume da linguagem.” (Marcuschi 2003).

        Em síntese, a retextualização permite que se parta, por exemplo, da fala - transcrição num contínuo de reorganização textual por meio das operações de regularização e transformação, dando à fala uma nova forma de texto escrito. Para tanto, os aspectos que induzem e se responsabilizam por esta retextualização: reordenação de conteúdo; eliminação das marcas da fala como: hesitações, truncamentos de palavras e frases, pausas, repetições, paráfrases; reorganização dos marcadores argumentativos, reorganização da metalinguagem (estrutura sintática), neutralização, falseamento, precisam ser bem compreendidos para que a pessoa que irá retextualizar possa fazer suas escolhas.

 

6. Análise de algumas re-textualizações

 

        A análise procura investigar as operações descritas presentes nos processos de retextualização. A proposta é a passagem do texto falado para o texto escrito. Como se verá, de certa forma, os falantes que retextualizaram o texto-base conseguiram preencher os propósitos das operações. Interessante será mostrar como os falantes manipularam as operações para chegar ao texto-alvo.

        Os falantes que fizeram essa atividade de retextualização, são alunos do 7º período de Letras da Universidade Federal de Rondônia - UNIR. Campus de Guajará-Mirim. Frutos de uma experiência por mim realizada em 2004. Os passos para a retextualização tiveram, primeiramente, o conhecimento da organização conversacional como base. As noções funcionais como as de relação dialógica, contexto de situação, propósitos dos falantes, condições, tópicos, organização de turnos, marcadores conversacionais, repetição, paráfrase, hesitação e correção, falas simultâneas, pausas, etc. foram fornecidas para que os alunos se inteirassem da organização de uma conversa.

        Para tanto, foi necessário ouvir várias vezes as conversas gravadas com as respectivas transcrições, uma vez que os alunos tiveram a noção dos mecanismos que organizam a conversa e se familiarizaram com as falas gravadas, reconhecendo cada falante, foi possível dar início às operações para a retextualização. Perceberam logo o caminho que iriam seguir e que as transformações seriam recorrentes, sucessivas e hierarquicamente ordenadas. Rapidamente situaram-se dos passos que deveriam seguir para os processos de regularização e transformação porque pelas operações podiam prever que a seqüenciação obedecia sempre à mesma direção, por sua vez condicionada pela presença de uma operação imediatamente anterior.

        Os exemplos que compõem a análise são fragmentos da língua falada em que ocorrem narrativas na fala informal. São falas espontâneas, nas quais os informantes se sentem bem a vontade diante do gravador. As conversas fluem naturalmente. Foram selecionados cinco inquéritos de fala sobre os quais se realizaram as re-textualizações. Esses inquéritos de fala são do meu corpus que atualmente analiso, na minha tese de doutoramento (os inquéritos possuem 26 transcrições de falas). São informantes adolescentes da cidade de São Paulo - Capital.

 

1. Texto original para transformação

 

L1 eles morrem de inveja dele ...

L2 e o pior que não

                             [

                        L1 não que que eles falaram?...

L2 o Victor não gosta do Bruno

L1 nossa::

L2 tipo pro Victor falar éh

                               [

                          L1 pro Victor

L2 então mais o Marcelo falou

                                              [

                                        L1 éh que ele/ ele se acha um pouquinho...

                                                                                                         [

                                                                                                   L2 ele cê acha muito que ele chegava assim falava assim chegava no quarto falava assim... nossa hoje eu tirei umas 10 fotos  com as minas e me segurei não fiquei com nenhuma ...

L1 ah::...

L2 o Marcelo disse que falô isso ...

L2 ai ele éh ai no dia seguinte ele começo a conversar com a Marília chego não porque não vale a pena ficar por ficar não sei o que querendo dai discursinho de moral na gente dando liçãozinha de moral na gente e daí eu ? a/ ...a Elisa falou assim á mais isso ele já falava antes ai o Marcelo éh mais não pra gente pra gente ele vinha falando que tava se segurando ...L1 meu oh assim ... eu falo pra ele quanto ele tá se exagerando lá a modéstia dele ele falo você éh modéstia em fio em falo pra ele aí ele aí não sei o que não sei que lá começa a zua sabe? mais assim eu dô uns toque assim entendeu porque ai quando eles começa com muito com olhe meu peitoral

                                 [

                           L2 olha oh nossa começaram a falar muita mal especialmente dessa musica do ...

L1 mais meu eles também tem uma pontinha de ciúme porque o Bruno faz sucesso né? pode falar o que quiser mais o Bruno as meni/ se viu quantos flesh tava tendo na hora que ele tava falando ?...

L2 não vi não sei eu vi que umas meninas

                                     [

                                L1 teve uma menina de Brasília

                                                                                 [

                                                                            L2 eu vi eu vi as /as meninas de Brasília né?

                                                                                                                   [

                                                                                                                L1 a uma teve uma mina de Brasilia... e a Joana tudo bem?

                        [

                   L2 eu vi eu vi

L1 mais assim sabe?

L2 hum hum

L1 éh :: ((risos))

L2 eu sei /mais as meninas de Brasília se sabe que elas falaram dele ?

 

Texto transformado

 

Disseram que o Victor não gosta do Bruno e o Marcelo explicou o porquê. Bruno e presunçosos. Não bastasse isso, tem por hábito exortar a turma com discursos moralistas e puritanos.

Bruno, no entanto, efetivamente faz sucesso. Isso aumenta ainda mais a inveja que seus amigos alimentam. por ele. Alvo do assédio dos fotógrafos, chama a atenção até mesmo de umas garotas da Capital Federal.

 

        Nesta transformação, o aluno que re-textualizou a fala, optou por um texto resumo em que condensa e generaliza as informações no conjunto do texto. Há uma compreensão clara do texto original. Todas as operações foram aplicadas. O aluno revela domínio da escrita e uma noção de economia verbal acentuada. Mesmo com o grau acentuado de eliminação, consegui conservar todas as informações do texto base.

        Houve uma drástica reestruturação sintática, léxica e semântica. Ocorrem interferências na formas e nos conteúdos, no entanto, as informações cruciais são mantidas. Apresenta-se como um narrador observador, e a força pragmática é percebida sutilmente pelos comentários que faz sobre o personagem principal "Bruno", que constitui o "alvo" de toda as falas das duas informantes. Por exemplo, emite opiniões desse personagem como "discursos moralistas e puritano", "...isso aumenta ainda mais a inveja que seus amigos alimentam. por ele. Alvo do assédio dos fotógrafos, chama a atenção até mesmo de umas garotas da Capital Federal" . Enfim, pode-se dizer que, não é especificamente no plano semântico, mas no plano pragmático que as marcas ilocucionais aparecem em evidência, isto é, são elas que respondem sobremaneira pelo conteúdo do texto original.

 

2. Texto original para transformação

 

L2 pera aí dexa eu falá ((risos)) e meus assim não só meus pais meu mas tipo a sociedade inteira assim pois uma:: certa pressão assim né? Cassiano você tem que aprender a não ser tão tímido então eu ... tive que aprender a me virar sozinho então isso implicava...consegui falar ...em público... e também uma coisa que eu achei muito importante nisso pra perda da timidez foi a escola assim que aconteceu muita /eu ficava muito revoltado quant/quando acontecia alguma injustiça contra minha classe ... eu do/a diretoria ia reclamar de alguma coisa que a gente não fez sabe? e tipo todo mundo ficava com tanto medo da diretoria que ninguém falava nada por exemplo... nem quem se defendia então eu ficava tão revoltado com essa situação com essa :: injustiça que eu acabava falando mesmo eu sendo tão tímido entendeu? aí aí eu acabei ... eu acabei... melhorando entendeu? mais foi isso que que você ia fala que eu te enterrompi?

L1 vamu lá no público queria falá agora ((risos))

L2 eu tava não eu tava falando de tímido

                                                               [

                                                          L1 não não lembrei meu amigo falô assim tipo problema não éh:: tipo ... ser tímido a esse pon::to entendeu? de não ir na cantina do colégio...nem essas coisas o meu problema ( é a sensação de ter tipo ) um monte de gente olhado pra minha cara sabe?...

L2 hum hum ...

L1 ah eu te falei né? que eu apresentei balé na escola de costa...

 

2.1 Texto transformado

 

Devido às pressões exercidas pela sociedade aos meus pais, eu era muito tímida, mas aos poucos venci esta timidez, pois tive que enfrentar as dificuldades que a vida nos oferece - falar em público.

Certa vez, revoltado com algumas injustiças contra minha sala de aula, tomei a decisão de ir à diretoria reclamar das acusações. Depois falei isso a um amigo – Cassiano - que ele teria que apreender a não ser tímido e não ficar inerte as problemáticas que surgissem.

Este amigo me olhando, disse: Lembro de certo dia, um amigo de colégio disse-me que o problema maior na timidez não é ir a cantina comprar algo, e, sim, o fato das pessoas ficarem olhando para você.

 

        Nessa transformação, já se observa que a redução é menor, todavia, todas as marcas da fala desaparecem. Segue-se a seqüência dos tópicos conversados. Há também mudanças de léxico e estruturas sintáticas. Observam-se preenchimentos e reestruturação de enunciados não acabados, característicos da fala. Por exemplo: "meu mas tipo a sociedade inteira assim pois uma:: certa pressão assim né?" é uma fala que se re-textualiza na escrita com marcadores da escrita e com nexos semânticos seqüenciados. A compreensão leva a aluna a induzir que as palavras "sociedade e pressões" estão ligadas no campo semântico, criando uma reorganização como "Devido às pressões exercidas pela sociedade aos meus pais, eu era muito tímida...".

        O texto é divido em parágrafos, cada segmento tópico conversado é colocado num parágrafo, mesmo sendo extensão do mesmo tema "timidez". No segundo parágrafo observa-se um falseamento de interpretação quando diz "Certa vez, revoltado com algumas injustiças contra minha sala de aula, tomei a decisão de ir à diretoria reclamar das acusações...", pois no texto original dá a entender que a diretora ia até a sala dar "bronca na turma", e não o contrário, e essa idéia fica implícita. Veja a fala " eu do/a diretoria ia reclamar de alguma coisa que a gente não fez sabe? e tipo todo mundo ficava com tanto medo da diretoria que ninguém falava nada por exemplo... nem quem se defendia então eu ficava tão revoltado com essa situação com essa :: injustiça que eu acabava falando mesmo eu sendo tão tímida".

        Observa-se, também, a opção pelo narrador onisciente (personagem) - discurso em primeira pessoa. A narradora apresenta-se falando de si, relatando suas atitudes numa seqüência narrativa, numa alternância entre descrição de sua personalidade – pessoa tímida e narração, em que conta sobre um amigo que era tímido. Nota-se que na fala esse amigo apresenta-se como falante, já no texto reescrito é feito alusão a ele. Veja exemplo: " Depois falei isso a um amigo – Cassiano - que ele teria que apreender a não ser tímido ...". Estas observações permitem intuir que as operações de retextualização da fala para a escrita são tomadas não apenas como indicadores da consciência da relação entre fala e escrita, porém como um exercício de compreensão e de domínio dos modelos globais de gêneros textuais. Isso se justifica pelas interferências do processo de compreensão, que de certa forma, advém da subjetiva de quem reescreve, além da forte influência exercida pelo processo cognitivo.

 

2.2. texto transformado

 

        Não são só meus pais, mas toda a sociedade que exerce certa pressão sobre os seres humanos que ocasiona a timidez em muitos. Eu, por exemplo, era bastante tímida. A minha relação interpessoal era muito prejudicada pela timidez em excesso. Aprendi, então, a me policiar, conseguindo até falar em público. Um dos fatores importantes que me ajudou a vencer a timidez foi o colégio. Sempre acontecia alguma injustiça, principalmente com minha classe, a diretora sempre presente reclamando de nossa sala. Ficava revoltada. Meus colegas calavam-se, temerosos em reagir contra a direção, porém era a única que retrucava contra as injustiças, passando por cima de minha timidez. Recordo, agora, um amigo que dizia que o pior da timidez, não é você ir à cantina comprar um refrigerante, por exemplo, mas a sensação de todos estar olhando e observando sua pessoa.

        Observa-se nesta transformação que todas as operações foram realizadas. O conjunto das informações foi mantido seguindo a seqüência dos tópicos conversados no texto original. Quanto à compreensão é possível intuir que houve falseamento semântico. A aluna associa que as pressões sociais e, também seus pais sofrem influências da sociedade, ou seja, deixa transparecer que a sociedade de certo modo, seria a responsável pela timidez dos filhos e pessoas. Veja " Não são só meus pais, mas toda a sociedade que exerce certa pressão sobre os seres humanos que ocasiona a timidez em muitos". Ao passo que no texto falado não fica clara essa idéia: " meus assim não só meus pais meu mas tipo a sociedade inteira assim pois uma:: certa pressão assim né?. Subentende-se que a sociedade exerce pressão sobre as pessoas, mas será que por causa dessas pressão as pessoas se tornam tímidas? Essa interpretação desvia o sentido da fala, pois as pessoas não são tímidas por causa da sociedade em si. Se analisar melhor, pode-se deduzir que há outros aspectos que influenciam na timidez humana. Isso também não nega que a sociedade possa ter sua contribuição nisso, porém, afirmar isso é falsear. Compromete a coerência do texto se comparado com o texto original. Estes desvios de sentido ocorrem porque falta, na fala, informações mais precisas, uma vez que ela se realiza numa interação face a face com recursos extra-lingüísticos que contribuem e canalizam a informação para a precisão do sentido. No ato da retextualização não há o informante em presença, por isso é possível a subjetiva interferir na compreensão e ocasionar desvios. Quanto às estruturas sintáticas houve reformulação no padrão escrito. Há trocas lexicais como "me policiar", "relação interpessoal" ao invéz de "aprendi a me virar sozinha".

        A aluna re-elabora o texto em um só parágrafo, deduz-se que há apenas um tópico para ser relatado. Coloca o episódio da escola como um fator importante para vencer a timidez, isso é dito na fala. Então, ao narrar esse episódio, o texto é mais coerente, vejam quando diz que " a diretora sempre presente reclamando de nossa sala. Ficava revoltada. Meus colegas calavam-se, temerosos em reagir contra a direção, porém era a única que retrucava contra as injustiças..., há coerência, porque a aluna não se compromete, uma vez que não afirma categoricamente que a diretora ia até a sala de aula, com faça aluna no texto retextualizado acima. Essa idéia está implícita no texto.

        É importante notar que as operações não são apenas indicadoras das relações entre fala e escrita, mas um exercício de compreensão do texto que leva à opção por gêneros textuais diferentes. Veja no texto reescrito anterior, optou-se por uma narrativa, nesse há a presença de um texto argumentativo. A aluna inicia argumentando sobre sociedade e timidez (como seu ponto de vista), em seguida narra dois exemplos: um acontecimento no colégio e a recordação de um amigo que fundamentam o tema timidez argumentado.

 

3. Texto original para a transformação

 

L1 a minha mãe já fez seleção sabia ?((risos)) sabe o que fez ela deu baralho mandô o povo inventar um jogo ...

L2 inventar ? ((risos))

L1 ÉH um jogo

                    [

                L2 Orra meu eu vou ficar com mó medo

                                                                               [

                                                                         L1 éh eu falei pra minha mãe eu vou inventar já agora porque na hora quando derem (prá ela /que ela foi selecioná)  ((risos)) e já sei sei qual que éh assim...                                                 [

                                                                          L2 quando eles forem ensinar você

L2 nossa eu vou achar muito difícil porque tudo que/  qualquer coisa que eu vou inventar aposto que ele ia achar muito parecido com algum outro jogo  e então eu ia acabá 

                                                                                                [

                                                                                          L1 éh eu também

disistindo de :: oh mó difícil ...

L1 ah tinha uns 20 ele escolheu só 1 só ...

L2 e assim o:: conhece além disso tem todas carga emocional de uma entrevista de uma seleção nossa vai ser muito difícil ...

L1 por isso que eu falô cê até tem condições e :: daí o emprego éh aquele negócio esse /cê com tempo cê acaba:: que nem -- eu achei mó legal se te falando na Assembléia de ontem assim i :: mais:: assim já/já é um grande passo assim prá tipo a luta contra a timidez ((risos))... e acho que :: você vai /vai ficá igual eu daqui a poco assim

L2 her:: leva um bom chão pra isso Cassiano ((risos))...

L2 assim... não assim TÃo extrovertido quanto eu mais pelo menos não tímida entendeu ?...eu acho que você consegue .... ((conversas Paralelas))

L1 ah sei lá ... ((vozes))

 L2 assim mais realmente ...éh:: assim é difícil que nem ...eu não sei se eu já te contei mais... eu perdi a minha timidez por :: necessidade... porque eu sou assim tímido eu era de natureza bastante tímido ...

L1 hum hum

                   [

                L2 se cê vê pegasse assim eu quando eu era crian::ça assim eu tinh/ tinha eu morria de:: medo de medo não né? de vergonha de:: de ir na cantina da escola ((conversa paralela)) sabe?

L1 her ((música)) não é pra tanto né? ((risada))

L2 éh mais eu era assim entrar em loja pra ver roupa ...sabe?

                                                                                              [

                                                                                             L1 hum hum

         

                                                                                                       [

                                                                                                     L2 eu me sentia super acanhado ... i:: ((risos))

                    [

                L1 ah mais tipo

 

3.1 Texto transformado

 

- Minha mãe já fez seleção. Ela distribuiu o baralho e pediu aos candidatos que inventassem um jogo.

- Inventar?

- Sim, um jogo.

- Nossa, eu ficaria com muito medo.

- Pois é, já falei para minha mãe que inventarei um jogo agora, porque na hora quando me derem o baralho, saberei o que fazer.

- Em seu lugar acharia a atividade muito difícil, pois tudo que eu inventasse, acredito,

ficaria muito parecido com qualquer jogo e aí acabaria.

- Eu também desistiria. Sabe, tinha aproximadamente 20 candidatos, mas ela escolheu

apenas um.

- Levando em conta toda carga emocional de uma seleção...

- Você tem condições. O primeiro emprego é difícil e a timidez com o tempo se acaba...

- Isso leva tempo, Cassiano. Você consegue!

- Não sei...

- Quando eu era criança, morria de vergonha em quase tudo que fazia, até para ir à cantina da escola. Agora perdi minha timidez por necessidade.

- Sua timidez na infância era exagerada?

- Até para ir em uma loja, eu era assim...

 

        Neste texto, não houve propriamente uma retextualização, levando em conta as operações dos processos de retextualização que deveriam ser aplicados. Há redução no texto, dos recursos da fala como repetições, truncamentos, falas simultâneas, marcadores conversacionais (maior parte), etc que foram apagados, e, também, a manutenção da seqüência de fala nos tópicos conversados .

        Este aluno, optou por manter o discurso direto, esse recurso ainda se caracteriza como fala. Utilizou o recurso do travessão que alterna as falas na narrativa. Embora tenham desaparecido quase todas as marcas da fala, ainda se observam certas marcas da língua falada, o que caracteriza o diálogo propriamente, (note os negritos), porém, os travessões, a pontuação e a reformulação de orações, troca de léxico já caracterizam indícios de texto escrito. A presença de pronomes egóticos (veja itálico) desnecessário na escrita, mas necessário na fala ainda permanece de forma parcial. O pronome "eu" em função de sujeito é totalmente desnecessário na escrita, pois o morfema verbal marca a pessoa do verbo, mas necessário no diálogo falado e no escrito quando representa a fala (discurso direto). Quanto ao pronome "ele" há momentos que na escrita são necessários, devido à neutralização dos de certos verbos com a 1ª e a 3ª pessoas no singular, que são iguais, havendo, em certos momentos, no contexto a necessidade do sujeito ser marcado por "ela" e "ele".

        Certamente fica caracterizada uma limitação na aplicação das estratégias de retextualização, pois não houve reorganização e seleção de novas das estruturas sintáticas, com agrupamento condensando as idéias com presença de marcadores coesivos.

 

4. texto original para transformação

 

L1 se sabe que/ que ...eu fiz primeira comunhão com o pai do Pepino né? ? cê sabe?

                                                                                                                                 [  

                                                                                                                              L2 cê falô

                                                                                                                                           [

                                                                                                                                     L1não então uma vez é/é nossa foi mó legal assim u/uma das missas ele que me deu a comunhão sabe daí... eu lembrei direitinho da minha primeira comunhão sabe? dele dando entregando...

               [

          L2 entregando

 

L1 é:: lhe que deu ...foi bonito

                                              [

                                         L2 se fez/ se fez no (Minerópolis) também ?...

L2 primeira comunhão?

L1 éh::

L2 fiz na:: / na igreja do lado do meu colégio

                                                                      [

                                                               L1 ah eu sei do Sagrado Coração mais o catecismo foi no (Minerópolis) ?                                                                             [

                             [                                                                      L2 éh

                             L2 não não foi COm o colégio foi só da igreja

                                                                                     [

                                                                                 L1 ah tá eu eu fiz catecismo lá no colégio mais nossa meu não acho que eu não peguei nada do catecismo tá ligado?

                                                                                                                 [

                                                                                                                 L2 ham ham ...eu tinha um lindo

      [

L1 nossa, era muito  lindo tipo meu colégio não tinha nada a vê (pra mim).

                                                                                                                 [

                                                                                                               L2 e:: assim na/na eu tinha começado fazê na paróquia catecismo tá ligado? aí ... mais... sabe? éh::/ nada a vê assim foi / foi (muito melhor o catecismo lá ( ) sei lá sabe? tem mais a vê com o movimento assim sei lá acho não sei)

                                      [

                                 L2 mais que/ que igreja qui cê fez?...

L1 Eu fiz lá no/ lá no ... aí que igreja que eu fiz a/ o primeiro catecismo...a professora era mó chata catequista tá ligado? i:: mais foi na /na numa /perto do meu colég/ do colégio que eu estudava antes dos Anjos ...

L2 mais a missa foi na Sagrado Coração?...

L1 Foi ...

L2 Ham...

 

4 .1 Texto transformado

 

        O diálogo envolve duas adolescentes Marília e Camila. Marília inicia contando como foi sua primeira comunhão. Diz que foi o Padre Pepino que realizou. Em uma das missas que assistiu com o Padre Pepino, relembra sua primeira comunhão. Guarda boas recordações de sua primeira comunhão na Igreja Sagrado Coração. Camila, em seguida, relembrando também de sua comunhão, diz a Marília que fez o catecismo no colégio, mas que quase não se aproveitou nada dos ensinamentos, porque havia um garoto lindo que lhe tirava a concentração. Marília fala, também, que fez seu catecismo na igreja que ficava perto de seu colégio, não sabe dizer o nome, relembra o fato importante, que a catequista era muito mal-humorada e por fim diz que a celebração de sua comunhão foi na Igreja Sagrado Coração.

        Nesta transformação, observa-se que todas as marcas da oralidade desaparecem. Houve reformulação das estruturas sintáticas e mudanças léxicas como "aproveitou nada dos ensinamentos", "garoto lindo que lhe tirava a concentração", "catequista era muito mal-humorada", "a celebração de sua comunhão" que preenchem o texto com informações mais precisas. Essas informações ficam implícitas na fala. Então a necessidade do processo de compreensão das informações para ser possível a retextualização. O diálogo dessas adolescentes é muito fragmentado e cheio de abstrações (subentendidos) por expressões da fala como "nossa era muito lindo tipo", assim na/na eu tinha começado fazê na paróquia catecismo ta ligado? Aí... mais... sabe? Éh:: nada a vê", etc. Construções típicas na fala de adolescentes, pois nunca estão preocupados em passar informações propriamente, mas falar para manter os laços afetivos. Por isso, mesmo que o aluno que reescreveu a fala, tenha domínio de escrita, fica difícil reestruturar se não compreender por completo as informações da fala. Mesmo com a escuta da fala em fita cassete, esse problema pode permanecer.

        Nesses casos, pode haver falseamento de informações, o que parece que não foi o caso. O resumo apresenta as informações condensadas no conjunto do texto, seguindo a seqüência em que as falas ocorreram. A subjetiva para a compreensão e o estilo, faz-se necessário, nesse caso, a aluna para retextualizar procura, além de compreender a fala, ser imparcial no relato que faz sobre a fala das duas informantes. Pragmaticamente falando, não deixa marcas claras de interferência ilocucional, embora elas existam. Em síntese, pode-se dizer que todas as operações sugeridas foram realizadas, ocorreu um grau significativo de eliminações e um gama razoável das informações originais foi mantido.

 

Considerações finais

 

        Neste estudo, o que se procurou fazer, foi mostrar que não há um abismo entre a oralidade e a escrita, que este mito de que fala e escrita são duas propriedades estanques, precisa ser desfeito. Para tanto, a utilização das propostas teóricas de Marcuschi (2003) em que fala e escrita se dão dentro do continuum tipológico das práticas sociais e não numa relação dicotômica de dois pólos opostos e, as sugestões de análise, através de um modelo de retextualização devem ser divulgadas e conhecidas por todos que trabalham com a linguagem.

        Esta experiência vivenciada por mim e aplicada a alunos universitários do curso de Letras comprova que o modelo previsto funciona, pois as operações de retextualização facilitam os caminhos que devem ser percorridos pelos alunos na construção de textos.

        Conforme, pode-se observar na análise, os alunos deram conta das atividades de retextualização, elaborando textos coesos e coerentes, demonstraram que para o domínio da escrita, as referências da oralidade contribuem em muito. A retextualização fala/escrita estabelece parâmetros que diferenciam os mecanismos de organização de ambas. Com isso, fica claro que, tanto a oralidade como a escrita, possuem graus de coesividade e coerência, fato que permite a compreensão do texto fala e as abstrações de raciocínio dele retiradas para a elaboração do texto escrito. Os processos de compreensão desenvolvidos na oralidade são os mesmos que na escrita, variando apenas as maneiras de apresentação de ambos, devido às condições de produção de cada um.

        Por fim, espera-se que este estudo possa dar uma contribuição a todos que trabalham com a linguagem, principalmente aos professores de Língua Materna. E que se possa esclarecer que a língua não é um simples sistema de regras, mas uma atividade sócio-interativa que utiliza o código para a interação social. Assim, a língua não é um mero instrumento de transmissão de informações. É um fenômeno sócio-cultural que se determina e se consolida nas relações interativas, contribuindo de forma decisiva para a criação de novos mundos. É por meio da língua que o homem constrói sua história.

 

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NOTAS

[1] Tese postulada por Walter Ong (1982), cuja obra se acha em português sob o título  Oralidade e Cultura escrita. A Tecnologia da Palavra (1998) e Jack Goody (177), com a obra Domesticação do Pensamento selvagem  - tradução (1988), ambos tidos como representantes da “grande virada” cognitiva representada pela introdução da escrita. Para esses autores nosso grau de desenvolvimento tecnológico e nossa capacidade de raciocínio formal seriam impensáveis sem a escrita. Logicamente que essas teses não são mais sustentáveis hoje. Os próprios autores deixaram-nas de lado.

[2] Taylor & Cameron (1987) denominam regras de editoração  aquelas regras usadas pelos gramáticos para idealizar os dados orais, “ depurando-os” de todos os elementos (formalmente) inanalisáveis, tais como hesitações, os marcadores, e as autocorreções.

 

 

      

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